
O levantamento de abrangência inédita comprovou uma hipótese dos anos 70 – e fornecerá subsídios para iniciativas de conservação desses insetos, imprescindíveis para a agricultura.
DA REDAÇÃO | UOL
Cientistas conseguiram, pela primeira vez, mapear a distribuição das 20 mil espécies de abelhas que existem no mundo.
O novo mapa global ajudará na conservação dos insetos dos quais a humanidade depende para a polinização das plantações, afirmam pesquisadores de Cingapura e da China.
As abelhas enfrentam uma enorme pressão sobre o número de sua população devido à perda de habitat e uso de pesticidas.
No entanto, pouco se sabe sobre a variedade de espécies que vivem em todos os continentes, exceto na Antártida: desde as minúsculas abelhas sem ferrão até algumas do tamanho de um polegar.
As abelhas fornecem serviços essenciais para nossos ecossistemas e são os principais polinizadores de muitos de nossos alimentos básicos.
No entanto, até agora, não tínhamos dados para mostrar onde estava a maioria das espécies, diz Alice Hughes, da Academia Chinesa de Ciências em Yunnan.
“Aqui combinamos milhões de registros para criarmos os primeiros mapas da riqueza global das abelhas. E entendermos por que vemos esses padrões”, explica à BBC.
O resultado final trouxe uma revelação sobre as espécies de abelha. Ao contrário do que muitos biólogos imaginavam, estes insetos apresentam um raro gradiente latitudinal bimodal. Oi? É bem simples, verdade: significa que as abelhas são mais abundantes em climas áridos e temperados, localizados longe da linha do Equador. Dá uma olhada no mapa abaixo.
Esse padrão de distribução geográfica é o oposto do observado na maioria dos outros animais – na média, a biodiversidade da Terra é muito maior nos arredores do Equador, onde é quente e úmido, do que em lugares mais secos e frios.

As áreas escuras demonstram a incidência de abelhas
A suspeita de que as abelhas seguem esse padrão data da década de 70, mas ainda não havia sido possível comprová-lo por falta de dados.
Há algumas hipóteses para explicar tal anomalia. De acordo com os pesquisadores, a abundância de abelhas nessas regiões pode estar relacionada à grande quantidade de plantas rasteiras – que florescem nas temporadas chuvosas e servem de alimento. Florestas densas e repletas de árvores, por outro lado, não são fontes de alimento tão adequadas às necessidades desses bichinhos.
“Esses mapas e nosso quadro de referência podem formar a base para trabalhos futuros, permitindo-nos compreender melhor os padrões de riqueza das abelhas e garantir que sejam conservadas de maneira efetiva no futuro.”
Algumas espécies de abelhas em regiões como a Europa e América do Norte são bem estudadas. Mas em outras regiões, como grande parte da Ásia e da África, a documentação é escassa.
Embora ainda haja muito a ser aprendido sobre o que impulsiona a diversidade das abelhas, a equipe de pesquisa espera que seu trabalho ajude a conservar as abelhas como polinizadores globais.
“Ao estabelecer uma linha de base mais confiável, podemos mapear com mais precisão o declínio das abelhas e distinguir melhor as áreas menos adequadas para as abelhas de áreas onde elas deveriam prosperar, mas foram reduzidas por ameaças como pesticidas, perda de habitat natural e pastoreio excessivo”, diz John Ascher, da Universidade Nacional de Cingapura.
Como o mapa foi feito
Para criar o mapa, os pesquisadores compararam os dados sobre o aparecimento de espécies de abelhas com uma lista de verificação de mais de 20 mil espécies compilada por Ascher.
Isso deu uma imagem mais clara de como as muitas espécies de abelhas estão distribuídas no mundo.
O estudo confirmou que, ao contrário de outras criaturas, como pássaros e mamíferos, mais espécies de abelhas são encontradas em áreas secas e temperadas distantes dos polos do que em ambientes tropicais próximos ao equador.
Existem mais no hemisfério norte do que no sul, bem como em regiões quentes em partes dos Estados Unidos, África e Oriente Médio.
Há muito menos espécies de abelhas nas florestas e selvas do que em ambientes desérticos, porque as árvores tendem a fornecer menos fontes de alimento para as abelhas do que plantas e flores.
A pesquisa foi publicada na revista Current Biology.
“Mais do que confirmar hipóteses do passado, a pesquisa incentiva um olhar mais cuidadoso para o futuro.“
As abelhas são essenciais para a agricultura. A polinização realizada por esses insetos é responsável por girar US$ 500 bilhões todos os anos. Apenas uma pequena parcela das 20 mil espécies de abelha contribui com o esforço humano de produção de alimentos. Uma delas é a Apis mellifera – a famosa abelha amarelinha de listras pretas. Essas espécies acabam sendo mais estudadas por darem lucro, e assim se tornam mais famosas entre leigos.
É importante preservar essas abelhas, já que sem elas a nossa civilização entraria em colapso. E o mapa ajuda com isso. Mas o mapa também ajuda a divulgar abelhas underground, que estão fora do radar do público não especializado: muitas crianças sequer imaginam que existem abelhas de outras cores.
“Conhecer a nossa diversidade de abelhas em nível global é muito importante. Talvez esse trabalho nos mostre quais são as áreas para as quais nós devemos olhar com mais cuidado na hora de planejar programas de conservação.”
Esses programas são urgentes. Uma pesquisa publicada em 2016 pela Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) com apoio da ONU indica que 40% das espécies de abelha que ocorrem na Europa e na América do Norte correm risco de extinção. O estudo não considerou outros continentes por falta de informações.
Os dados disponibilizados no mapa se tornam uma arma poderosa quando combinados às previsões das ciências atmosféricas sobre o futuro do clima no planeta. A diminuição no número de insetos polinizadores como consequência do aumento médio na temperatura global deve afetar o Brasil e muitos outros países em desenvolvimento que são economicamente dependentes da agricultura.
Sobre as abelhas
• Existem cerca de 20 mil espécies conhecidas de abelhas, em sete famílias distintas;
• Algumas espécies vivem em colônias, enquanto outras são insetos solitários;
• Embora alguns grupos como os zangões sejam bem estudados, mais de 96% das espécies de abelhas são mal documentadas;
• Muitas safras, especialmente em países em desenvolvimento, dependem de espécies de abelhas nativas, não de abelhas produtoras de mel