
COLUNISTA | Cultura&Realidade, por Diogeano Marcelo de Lima
O blues é um ritmo que surgiu nas plantações de algodão nos Estados Unidos no século 19, onde, durante a colheita, os escravos cantavam de forma ritmada, com um declamando um verso e outro respondendo.
O blues, tem esse nome por conta de a cor azul ser associada a tristeza na cultura americana da época, eram músicas melancólicas sendo a expressão genuína do sofrimento negro decorrente da escravidão e maus tratos sofridos, o blues é filho do sofrimento de milhares de escravos negros nas fazendas estadunidenses e que acabou dando origem a outros ritmos musicais como o Rock’n Roll.
O ritmo saiu dos campos agrícolas e tomou conta das cidades, fazendo muitos negros serem reconhecidos pelo talento, no entanto, esse reconhecimento não significa a diminuição do racismo, pelo contrário, apenas há uma readaptação do racismo que deixa de explorar a mão de obra escrava para explorar artistas com um pagamento inferior aos lucros gerados por seus talentos.
No início da ascensão do blues, o estilo musical era visto com maus olhos, por ser considerada “música de preto” e, portanto, somente negros é que a ouviam, no entanto, a beleza do estilo musical foi rompendo barreiras, caindo no gosto dos americanos em geral.
No início dos anos 20, a indústria do blues era extremamente misógina, havendo apenas homens se destacando como artistas do gênero. Nesse cenário, surge Ma Rainey,uma das primeiras mulheres a se destacar no meio musical como cantora de Blues, com talento inato e personalidade forte foi capaz de abrir caminho para várias outras cantoras rumo ao sucesso, sendo coroada como a “mãe do blues”.

A Voz Suprema do Blues não se trata de um filme biográfico, mas é baseado em uma personagem real, Ma Rainey,interpretada por Viola Davis (vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante pelo filme: um limite entre nós). A história se passa em um dia quente de 1927 na cidade de Chicago, com a gravação de um disco pela Ma Rainey e sua banda que a todo momento enfrenta os seus empresários brancos que tentam controlá-la a todo custo.
Por outro lado, um personagem ganha destaque, é o traumatizado e ambicioso trompetista Levee Green, interpretado pelo saudoso Chadwick Boseman (T’Challa de Pantera Negra). Destaque-se que, A Voz Suprema do Blues foi o último trabalho de Chadwick Boseman, que nos deixou precocemente em agosto de 2020, deixando a sua marca no cinema como um dos atores mais talentosos.
Dirigido por George C. Wolfe, é uma adaptação original da peça teatral de August Wilson, traz longos monólogos de ambos os personagens, proporcionando ao expectador uma imersão nas dores e traumas vividos pelos personagens principais apresentados, que atuam a flor da pele com uma carga emocional indescritível, especialmente pela atuação do personagem Levee Green, (Chadwick Boseman) que sem dúvidas, configurou uma despedida memorável aos fãs a altura de seu talento soberbo como ator.
Um dos motivos para ter escolhido a Voz Suprema do Blues como a minha primeira indicação de 2021 não é apenas pelo fato de gostar muito do ritmo do blues, mas também pelo que o blues significa e por toda a sua trajetória, pois não se trata de um ritmo, apenas, mas sim a expressão do sofrimento vivido por milhões de seres humanos que foram desumanizados pela escravidão.
Dessa forma, quero começar 2021 chamando a atenção para esse problema persistente que é o racismo, em todas as suas formas. Não devemos aguardar surgirem novos George Floyd ou João Beto para só então entendemos que vidas negras importam, não podemos esperar até a próxima fatalidade para falarmos sobre esse assunto. Como melhor descreve Robin Diangelo: “Não basta não ser racista, devemos ser antirracistas”, e diante todos os acontecimentos de 2020 que retrataram a persistência do nosso racismo sistêmico, este assunto deve ser debatido.
A Voz Suprema do Blues é um filme impactante, que conta com o talento indescritível de Viola Davis e Chadwick Boseman, ambos com atuação impecável, e que narra, de forma teatral, um pequeno trecho da história do blues, mostrando de forma visceral o racismo entranhado não apenas nos Estados Unidos, mas em toda América. Sem dúvidas umas das melhores obras do catálogo da Netflix! Vale muito a pena assistir.
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Advogado, colunista,
palestrante e pesquisador.
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