
Alan Oliveira Machado
Dias atrás, Bolsonaro disse, na ONU, pasmem, que existe “cristofobia” no Brasil. Essa é nova… Deve ser uma variante ideológica de discriminação a evangélicos ultradireitistas, semelhante à homofobia ou ao racismo, suponho. Assim, o presidente deve estar querendo vender o peixe de que existe, por estas terras, perseguição, violência e extermínio de cristãos evangélicos e, em consequência, a negação das ideias de Jesus Cristo, aquelas do Novo Testamento. Pois bem, não existem estatísticas de preconceito, de violência ou de extermínio de evangélicos, melhor, não existe dado social algum que sustente essa patacoada retórica, chamada de “cristofobia”, praticada contra evangélicos devido a suas crenças e costumes. É uma invenção de gente porca e mentirosa que pretende insuflar evangélicos de boa-fé contra qualquer pessoa que reaja à bandalheira moral, política e corrupta da milícia que está no poder.
Se o objetivo de Bolsonaro não fosse assanhar os ânimos de uma militância evangélica a seu favor, levaria em conta os dados oficiais e constataria que a intolerância religiosa no Brasil aflige majoritariamente as religiões de matriz africana e a católica. Os dados sobre intolerância religiosa praticada contra evangélicos são insignificantes, embora o IBGE tenha contado em torno de 43 milhões de seguidores dessa matriz religiosa no País. O que se vê na atualidade é uma grande infiltração de alas evangélicas nos espaços políticos, que reflete também uma dissensão interna no movimento e os vetores dessa infiltração desprezam o princípio da pluralidade democrática e avançam sobre os direitos dos brasileiros com atitudes mais apropriadas às teocracias, ao passo que protegem práticas supostamente religiosas que em nada lembram os princípios cristãos.
Os supostos evangélicos que sofrem desgastes nas redes sociais são aqueles pastores que exploram a crença de pessoas fragilizadas economicamente, emocionalmente e educacionalmente, vulneráveis à retórica canalha daqueles falsos cristãos. Os tais pastores vítimas de “cristofobia” oferecem feijões mágicos por mil reais, para combater a covid-19, máscaras bentas, canetas ungidas que realizam desejos, água de torneira como se fosse do rio Jordão, para salvar a alma etc. Os fiéis, mediante a incontinência retórica torpe e desonesta desses pregadores, sentem medo, culpa e pavor, o que os impele a aceitar a extorsão impiedosa praticada por esses comerciantes perversos da fé. Não satisfeitos em extorquir pessoas com todo tipo de vulnerabilidade, esses vendilhões agregam aos ritos de fé que inventam o nome de candidatos supostamente ungidos e salvadores com o fim de elegê-los e fortalecer seus interesses de poder.
Os pastores que, pelas insinuações de Bolsonaro, são perseguidos e exterminados, como se fossem os homossexuais ou pretos pobres de nossas tristes estatísticas, na verdade, se locupletam enquanto desprezam os problemas reais das pessoas que os seguem de boa-fé e com espírito cristão. Esses fiéis, na verdade, necessitam de solidariedade, de respeito, de justiça, de apoio financeiro e moral, de proteção e amor, coisas que o Jesus do Novo Testamento nunca negou a quem necessitasse.
Este ateu que vos fala foi à Bíblia mais de uma vez para conferir os princípios de Cristo e constatou que ele foi aquele cara que comprou briga para defender uma prostituta; que se compadeceu com um cego esmoler e o curou; que se solidarizou com uma família que chorava a morte de Lázaro e o ressuscitou. Foi aquele que multiplicou e dividiu o pão quando havia muitos famintos ao seu redor; foi aquele que baniu do templo os falsos pregadores que tratavam a igreja como empresa e a fé como meio de fazer negociatas, foi aquele que desprezou bens materiais e repudiou o poder quando este servia apenas à luxuria de alguns sobre a desgraça da maioria. E tudo que está escrito sobre Jesus nas páginas do livro sagrado dos cristãos mostra que os evangélicos desprezados nas redes sociais são o contrário de Jesus Cristo. Pelo que fazem, provavelmente seriam os piores algozes do Cristo se ele aparecesse por aqui. Possivelmente o condenariam por algumas moedas de prata, porque eles é que praticam a tal “cristofobia” alardeada por Bolsonaro; eles é que não amam o próximo; eles é que odeiam minorias, pobres, criancinhas e desvalidos.