– Histórico da instituição e o voto decisivo de Celso de Mello sobre o tema, pode ser usado a favor do presidente Bolsonaro –
DA REDAÇÃO I Cultura&Realidade
De acordo com posicionamento da corte, em placar apertado e com argumentos do ex-decano do STF, ninguém é obrigado a ser solidário com o poder público, inclusive em situações como a que ocorreu, em que o presidente não compareceu na Polícia Federal para depor.
O ocorrido estimulou no segmento jurídico, aquecida discussão sobre eventuais descumprimentos de ordem judicial por parte dos chefes do Executivo – e as possíveis consequências envolvidas no episódio.
Por decisão do ministro Alexandre de Moraes, alçado ao posto de “inimigo da vez” do Palácio do Planalto, Bolsonaro foi intimado a depor à Polícia Federal no âmbito de um inquérito sobre o vazamento de informações sigilosas envolvendo ataque hacker ao sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O chefe do Executivo, no entanto, alegou que exerceu o “direito de ausência” ao não comparecer ao depoimento. A tese do mandatário ressoa no STF. O ex-decano do STF Celso de Mello, por exemplo, já deu um voto decisivo alegando que ninguém pode ser obrigado a cooperar com o Poder Público, o que incluiria até mesmo faltar a depoimentos, como fez Bolsonaro agora.
“A condução coercitiva do investigado ou do réu, para efeito de interrogatório, revela-se ilegítima, eis que a pessoa exposta à persecução estatal tem o direito de não comparecer ao ato de sua própria inquirição. Ninguém pode, em virtude do princípio constitucional que protege qualquer acusado ou indiciado contra a autoincriminação, ser constrangido a produzir prova contra si próprio ou, então, sofrer, em função do legítimo exercício desse direito, restrições que afetem o seu ‘status poenalis’”, escreveu Celso de Mello, ao longo de um voto de 31 páginas.
“Em suma: o direito ao silêncio – e o de não produzir provas contra si próprio – constitui prerrogativa individual que não pode ser desconsiderada por qualquer dos Poderes da República. A impossibilidade constitucional de constranger-se o indiciado ou o réu a comparecer, mediante condução coercitiva, perante a autoridade policial ou a autoridade judiciária, para fins de interrogatório, resulta não só do sistema de proteção das liberdades fundamentais, mas, também, da própria natureza jurídica de que se reveste o ato de interrogatório”, concluiu. Na época em que Celso proferiu o voto, Bolsonaro ainda era um deputado federal do baixo clero que não havia subido a rampa do Palácio do Planalto.
Para Celso de Mello, o direito de não produzir provas contra si mesmo, e o de não comparecer a interrogatórios, vale para qualquer cidadão brasileiro — seja para quem vive debaixo de uma ponte ou para quem ocupa o posto mais alto da República. Ou seja, Bolsonaro não teria descumprido ordem judicial no caso. No julgamento da condução coercitiva, Alexandre de Moraes votou a favor da medida, mas acabou derrotado. Assim como Moraes, Celso de Mello também foi duramente atacado por Bolsonaro por conta de decisões históricas, como a criminalização da homofobia e o levantamento do sigilo da tenebrosa reunião ministerial do presidente com auxiliares, marcadas por xingamentos, palavras de baixo calão e ameaças ao STF.
Fonte: Veja