
DA REDAÇÃO | Cultura&Realidade, Por Diogeano Marcelo de Lima
Meu caro leitor, preciso começar este artigo com um pedido de desculpas, desculpas pela inversão da ordem no envio da minha crítica semanal, afinal, não posso deixar de passar em branco uma data tão importante como o dia 8 de março, escolhido para se comemorar o dia internacional das mulheres, data criada não apenas para se comemorar ou homenagear, mas também para tentar se corrigir séculos de discriminação e misoginia praticados contra mulheres que ousaram ter coragem.
Em minha defesa, alego que, todas as devidas homenagens não se resumem a apenas um dia, e toda a beleza do 8 de março não está restrito a apenas um dia, portanto, podemos muito bem falar em mês da mulher, e quem, sabe, um dia estaremos de fato, tendo o ano da mulher, e assim lhe sejam devidas as homenagens e considerações diárias, e quando digo isso, falo de realmente haver um mundo sem violência contra a mulher, onde ela possa terminar um relacionamento sem ser morta, trabalhar sem ser explorada, usar a roupa que quiser sem ser perturbada ou julgada e ganhar dinheiro sem alguém achar que é um “véio” que a está bancando.
Pois bem, eu estava aguardando justamente que o mês de março chegasse para poder indicar esse excelente filme israelense que narra a história de uma pequena comunidade árabe, o qual aborda com bastante sutileza a flexibilidade moral que há entre as regras morais adotadas pela sociedade, no nosso bairro por exemplo, e as regras adotadas em nossa casa.
A grande contribuição do filme TEMPESTADE DE AREIA é que ele foge do óbvio, ao permitir a evolução dos personagens que moldam a própria conduta ao longo do filme mudando a própria postura uma hora liberal outra conservadora e vice e versa o que, como não podia deixar de ser, evita um final clichê e saturado, embora possa não ser o almejado pelo expectador (não se deve desperdiçar um bom drama, não é mesmo?).
A diretora Elite Zexer segue a estrutura do realismo social fixando no centro da trama o conflito familiar vivido entre a jovem Layla (Lamis Ammar)e sua mãe Jalila (Ruba Blal) apesar de ter um pai amoroso Suliman (Hitham Omari) relativamente progressista, precisam conviver com a sua nova esposa. Não bastasse isso, a jovem Laylaprecisa do consentimento do seu pai para namorar o rapaz de outro vilarejo (tribo) que também é seu colega de faculdade.
Um fato curioso, é que a diretora utiliza a câmera na mão focando a imagem nos rostos dos personagens, evitando assim, planos longos e abrangentes captando todo o terreno ao redor, essa ausência de recuo da câmera, totalmente intencional, tem o propósito de causar a sensação de sufocamento no expectador, uma forma de descrever como é a vida das mulheres ao sul de Israel através de sensações psicológicas, uma mensagem inteligente que a diretora introduziu a luz da própria experiência pessoal neste longa-metragem.
O longa-metragem pode causar espanto, pois mostra a realidade cotidiana de mulheres que vivem sob o julgo de uma cultura totalmente diferente da nossa, onde o único direito que detém é praticamente o de serem submissas, primeiramente ao pai, que é quem escolhe com quem devem se casar, e depois ao esposo, que pode escolher casar com outras esposas e pode decidir qual delas vai morar em uma casa melhor que a outra esposa e terá mais conforto que as demais, e todos estão sob o julgo da teia social em que se encontram inseridos.
Por outro lado, o filme nos revela uma outra verdade, a de que o cinema pode ser uma excelente ferramenta de intercâmbio cultural a partir do momento em que nos permite conhecer outras culturas, sem, no entanto, termos realmente estados lá. É possível viver em outro lugar sem, no entanto, ter saído além de nossas fronteiras.
Mesmo que o desfecho do filme seja surpreendente, e acabe se distanciando das nossas expectativas, é um uma ótima escolha para ser assistido em comemoração ao mês da mulher, pois TEMPESTADE DE AREIA dirigido por Elite Zexer possui a força de reascender o debate do papel da mulher na sociedade e cria o desejo de repensarmos a nossa própria cultura a luz de outras culturas e quão distantes estamos dos valores ideais que precisam ser implantados em nossa sociedade: igualdade, liberdade e prosperidade para todos os gêneros, raças e credos.

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